Em três décadas muito pode ter mudado, mas Luísa Justino e Ema Gil Pires, caloiras em 1988 e 2015, reconhecem a mesma identidade à NOVA FCSH. Aos seus olhos, é uma faculdade irreverente que sabe acolher a diferença e o pensamento crítico.
Ema Gil Pires não consegue manter a firmeza na voz ao responder, percebe-se que está comovida. Talvez estar no último ano do curso e sentir que já não falta muito para cortar amarras a deixe mais sensível com este assunto. Ainda assim, apesar de haver muitas coisas boas que vai guardar, a sua memória mais marcante é mesmo do primeiro dia de aulas. “A minha mãe andava toda nostálgica com a ideia de voltar aqui e eu estava muito assustada. Era um bebé na altura e achava que não estava preparada para isto. Claro que estava, mas não sabia.”
Para trás ficava o secundário na área de Ciências e Tecnologias, durante o qual chegou a ponderar mudar para Economia, até Ciências da Comunicação lhe ter surgido como a escolha incontornável. No meio das dúvidas que a assaltaram no final do 12.º, ainda avaliou dedicar-se um ano exclusivamente a jogar ténis. Depois percebeu que podia conciliar os seus interesses, beneficiando do estatuto de estudante atleta. E foi assim que acabou a estudar na mesma faculdade da mãe, seguindo-lhe os passos bem mais de perto do que ambas tinham previsto.
“Entrei em 1988, para Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português-Francês”, recorda Luísa Justino. Na verdade, queria ir para a Faculdade de Letras, mas acabou por concluir que a NOVA tinha sido uma melhor opção. “Quando as coisas são novas, estranhamos um bocadinho. Ainda estava muito no início”, diz, explicando por que razão não fora a sua primeira escolha. No entanto, as suas reservas caíram por terra e acabou conquistada pela “fequeche”, como carinhosamente continua a chamar à faculdade. “Abriu-me totalmente os horizontes. Há 30 anos era muito diferente de todas as outras faculdades, era considerada mais à frente.” Aprendeu imenso, sublinha, adquirindo não só competências académicas, mas também competências humanas e sociais. “Guardo uma frase que nunca mais esqueci e que ouvi de uma professora de 27 anos: ‘As guerras começam e acabam por palavras’”.
“É uma faculdade muito irreverente. Há uma abertura de espírito muito grande, aqui temos pessoas muito diferentes — de diferentes nacionalidades, orientações sexuais, identidades, estilos — e mesmo assim há uma grande aceitação, as pessoas dão-se muito bem”, afirma Ema.
Em três décadas há várias mudanças a registar na vida de uma instituição, mas o essencial permanece inalterado, como se deduz das palavras de Ema: “É uma faculdade muito irreverente. Há uma abertura de espírito muito grande, aqui temos pessoas muito diferentes — de diferentes nacionalidades, orientações sexuais, identidades, estilos — e mesmo assim há uma grande aceitação, as pessoas dão-se muito bem.” E foi esta diversidade que a fez sentir-se em casa, a ela que vinha de uma área em que “eram todos certinhos”. “Aqui senti-me integrada, porque somos todos diferentes.”
Se há sítio onde se pode fazer um retrato nítido da heterogeneidade de que fala a finalista de Ciências da Comunicação, é a famosa esplanada. Ponto de encontro entre alunos de cursos variados, tem uma função social inquestionável. É curioso perceber como parece ter nascido de uma ocupação espontânea do espaço, no tempo em que Luísa Justino era estudante: “Sentávamo-nos no chão ou tirávamos cadeiras do refeitório e trazíamos cá para fora… Deve ter sido daí que nasceu a esplanada”, lembra, bem humorada.
As condições físicas não eram as melhores nessa altura e incluíam aulas “numas cavalariças que eram muito frias”, mas em contrapartida merece-lhe grandes elogios a proximidade que havia com os professores, a maior parte da mesma idade ou pouco mais velhos que ela própria. “No final do ano íamos todos curtir com eles. Essa parte humana também foi gira, porque uma coisa é vermos um professor lá dentro e outra é vê-lo cá fora a fumar e a beber como nós e a dançar.” Confessa mesmo que as melhores recordações que guarda são as “coboiadas” que faziam todos juntos. Grandes noitadas no Frágil e noutros bares do Bairro Alto, de onde saíam para ir comer bolos e caldo verde para a Ribeira — farras que vieram à memória precisamente quando acompanhou Ema no primeiro dia de aulas e se cruzou com uma colega dessa altura, Clara Nunes Correia, hoje aqui professora.
Foi mesmo uma grande surpresa a escolha da filha, pois não estava nada à espera de a ver entrar precisamente na sua “fequeche”. E, como revela Ema, percorrendo um caminho que podia ter sido o seu. “Quero seguir jornalismo, que era o que a minha mãe queria, mas o meu avô não deixou”, diz, para acrescentar emocionada: “É muito bom seguir o legado da mamã, é um grande motivo de orgulho”.